Estava à espera do início de uma aula na faculdade, sentada em um banco, mergulhada na luz fria da manhã de uma terça feira - o meio da semana costuma ser assim, certo? Não, ela sabia que não. Todas as terças-feiras sentava naquele lugar tedioso e esperava; não a aula, mas ele. Sim, ele.
Era inexplicável e inconsciente. Fernanda simplesmente sentia que havia um micro campo gravitacional que atraía seu olhar todas as vezes em que o via passar.
Nunca trocaram palavras, nem um "Bom dia" sequer. Mas ele - seus cabelos negros, seus intensos olhos castanhos, tudo nele - a atraía. Ela apenas o via passar, caminhando de modo despretensioso como quem passa pelo limbo; como se o mundo - incluindo aquela espectadora ávida por um olhar que a correspondesse - não existisse. Eram apenas ele e seus passos.
Várias terças vieram e terminaram. Os olhares,quase que suspirosos, de Fernada seguiam uma via de mão única, não havia retorno. Então, como de uma música que é configurada como toque de alarme no celular, ela cansou-se de olhar para ele. Já era hora! Afinal, por melhor que pareça a música, ela algum dia há de servir apenas como som ambiente.
Muito tempo passara desde aqueles olhares (todos dela, nós sabemos). Sua vida estava atribulada, sua mente estava cansada, pois estava no final de mais um semestre. Naquela trincheira com estudantes e suas olheiras de um lado e professores e suas mil e uma ideias de como reprovar um aluno do outro.
Ainda assim, Fernanda conseguiu ficar linda naquele dia, linda em sua praticidade (jeans e camiseta). Não era uma terça-feira, mas ela o viu. Ela não estava sentada em um banco, estava subindo a rua em direção à biblioteca, conversando com uma amiga enquanto ele vinha no sentido contrário. Fernanda o avistou ao longe, porém fingiu não tê-lo visto - aquele velho jogo, como sempre.
Aquela não era uma terça, não era sobre ele e seus passos. O limbo era apenas dela, poderia fazer o que quisesse. E o fez. Andando como se não houvesse nada além de seus passos, Fernanda foi de encontro a ele, percebendo que a distância diminuía a cada instante. Não, ela não o olhou diretamente em nenhum momento. Por que o faria?
Continuou a conversar com sua amiga. Ele estava cada vez mais perto. Ela dava cada passo como se seus pés não tocassem o chão, pois sentia-se em paz consigo mesma. Mais alguns passos e ele já teria passado. Então, quando percebeu que estava perto o suficiente, Fernanda deixou seus olhos em uma linha de visão ampla; de forma que não o encarasse diretamente, mas pudesse vê-lo de soslaio.
E o que viu foi delicioso! Não pôde dizer nada, mas sentiu-se recompensada. Foram apenas dois segundos, mas foram nítidos: dois intensos olhos castanhos estavam fixos em seus olhos esverdeados. Ela não tinha esperanças de que algo acontecesse entre os dois, mas a devolução de seus olhares dentro desses 2 segundos - mesmo com tanto tempo de atraso - a deixou em êxtase. Não tinha reclamações a fazer ao remetente.
Nathaly M.
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