terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Perfeições




Eram feios de dar dó, mas nem mesmo quando se conheceram viram isso um no outro. Ele sempre desejou as pernas dela, tortas e cheias de marcas de mordidas de mosquitos, envolvendo seu tronco desproporcional e exageradamente cabeludo. Imaginava o quadril extremamente fino e ossudo dela colado em sua pélvis.

Na primeira noite juntos viam apenas belezas. Ela colocava as mãos dele em sua bunda, tão escassa de carne, mas de onde ele tirava tudo o que precisava. O pescoço curto e grosso dele não a impedia de passar seus lábios finos por cada centímetro de pele. E os narizes avantajados não eram obstáculo para beijos que envolviam dentes tortos e bigodes, de ambos os lados.

Em suas imperfeições eram harmônicos. E isso fazia o desejo aumentar. Não se importavam com olhares, comentários feitos entre risinhos. Já estavam acostumados a conviver com aparências totalmente afastadas de padrões de beleza.

Juntos, sentiam-se fortes. Riam daqueles que corriam suados pela praia, que comiam apenas folhas no almoço, na tentativa de atrair alguém. Eles não precisaram disso.

Ela não foi a noiva mais linda. Ele não foi o príncipe dos sonhos. Não para os que viam. Mas eram, um para o outro, a personificação do amor. O que eles viam, ninguém mais enxergava. A aparência protegia aquele amor de invejas e cobranças. Ninguém perguntava sobre filhos. Tinham pena de imaginar os genes herdados pela criança.

Envelheceram juntos. Rugas nunca foram problemas. A atração sexual existia sim e nunca acabou. Nem de Viagra precisou. O amor nunca esteve ali na pele, nos músculos, na formação óssea, nos cabelos. O amor estava onde poucos vêem porque vivem distraídos com perfeições.

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