Da psicótica Natália Klein.
Nós também somos responsáveis pelo que
dizemos - e pelo que deixamos de dizer. Sou pentacampeã mundial na
categoria falar coisas horríveis sem pensar. E, na maioria das vezes, o
arrependimento vem durante o vômito de palavras inconsequentes,
raramente acompanhado de um pedido de desculpas. Porque sou hexacampeã
em orgulho idiota.
Nós somos responsáveis - ou pelo menos
tentamos ser responsáveis - por uma lista infindável de obrigações
morais. Não conseguimos nem nos livrar daqueles que cativamos. Como
decretou Saint-Exupéry em "O Pequeno Príncipe", somos eternamente
responsáveis por essa gente. E eu sei bem disso, pois não suporto a
ideia de que exista alguém no mundo que não goste de mim.
A
justificativa para todas essas responsabilidades, incluindo a de ficar
magra, bem vestida, ter um emprego apaixonante e uma pessoa incrível
para amar e ser amado, é chegar a algo próximo do que se considera
"felicidade".
Mas será que, assim como nossas contas para pagar, nós somos os únicos responsáveis por nossa própria felicidade?
É
natural pensarmos que não. Aprendemos desde cedo, na escola, que os
seres humanos dependem de outros seres humanos. Lembro da professora de
"Atualidades" falando sobre como o comércio era uma das provas de que
não somos autosuficientes. Nós precisamos trocar para sobreviver.
E
seguindo essa lógica, seria, de fato, impossível ser feliz sozinho. Tom
Jobim devia concordar com a minha antiga professora de "Atualidades".
De repente eles até já se pegaram. Isso explicaria muita coisa do que
ela dizia nas aulas.
De todo modo, se eles estiverem certos -
minha professora de "Atualidades" e o Tom Jobim - então a felicidade
está fora da nossa esfera de responsabilidade. Nós dependemos da troca
com outros seres humanos para sobreviver. Nós dependemos do quanto os
cativaremos e do quanto seremos cativados por eles. Nós dependemos das
suas escolhas, das suas palavras e das consequências de suas atitudes.
E, por isso, meus caros, seja como for, a culpa por nossos infortúnios
jamais haverá de ser nossa.
Ufa.
Acontece que, ao
nos livrarmos do terrível peso de sermos os únicos responsáveis por
nossa própria felicidade, adquirimos outras cargas, tão trambolhudas
quanto. Como a autopiedade, por exemplo. Culpar o mundo pelas injustiças
sofridas, lamuriar-se pelas tristezas vivenciadas, sofrer, sofrer,
sofrer, e depois sofrer mais um pouco é o que os seres humanos fazem
quando isentos da responsabilidade de serem felizes.
Ok, nós
precisamos da troca com outros seres humanos. Nós damos batatas e
recebemos tomates de volta. Só que se os tomates vierem todos podres,
cabe somente a nós decidir o que fazer com eles. Podemos sentar e
chorar, nos vitimizar, repetir que "só acontece comigo", que "é sempre
assim", "ó vida, ó azar"... ouuu - e sim, existe um ou - podemos
elegantemente juntar os tomates podres, jogá-los na lixeira e fazer o
melhor que nos for possível com as batatas que restaram na despensa.
Não
digo que é um trabalho simples. É milhões de vezes mais tentador chorar
pelos tomates podres no chão. Eu, por exemplo, seria uma suicida nata,
não fosse pelo meu egocentrismo exacerbado. Sou boa demais para morrer,
seria um desperdício. Mas tenho total consciência de quando escolho ser
infeliz. É aquela fração de segundo em que você deliberadamente opta
pelo sofrimento. Você tinha escolha, mas preferiu a habitual dose de
autodestruição e autopiedade. E é quase compreensível. É muito mais
fácil ser infeliz.
Para tentar ser feliz, você precisa
assumir responsabilidade pelas trocas efetuadas com outros seres
humanos. Para o bem e para o mal, você é o único responsável pela forma
como essas negociações te afetam. Já para ser infeliz, você não precisa
fazer absolutamente nada. É só esperar um pouco que os tomates podres
virão. E eles virão aos montes.
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