terça-feira, 25 de março de 2014

Resenha: Mar Adentro


            Essa é minha primeira resenha que é publicada. Pretendo fazer de livros também, mas estou esperando o término da minha releitura de dois dos meus favoritos para "começar com chave de ouro" se me permitem o trocadilho.



        Ramón é tetraplégico, ficou nesta condição após dar um mergulho em águas rasas no mar e lesionar o pescoço, prejudicando uma de suas vértebras cervicais. Desde sua juventude está preso a uma cama, pois não utiliza sua cadeira de rodas. Diz que assim estaria aceitando sua condição de deficiente. Apesar de sua condição física, Ramón não deixou de fazer o máximo de atividades possíveis: pinta e escreve poemas com a boca, com ajuda de aparelhos adaptáveis; ajuda seu pai e sobrinho com consertos mecânicos ou de marcenaria ao dar-lhes conselhos; dá entrevistas na TV etc. 

    Porém, mesmo conseguindo lidar com seu atual estado de saúde, Ramón encontra-se cansado e frustrado, pois não suporta mais as inúmeras intervenções médicas nem as limitações impostas pela realidade atual. Ele considera que não pode sequer ser capaz de amar uma mulher, pois não poderia satisfazê-la em toda sua plenitude devido à sua deficiência. Há muito tempo, ele decidiu pôr fim ao seu sofrimento, recorrendo à eutanásia. no entanto, em seu país, a Espanha, essa prática não é legalizada e, dentre outros aspectos (psicológicos, biológicos, espirituais, morais e éticos), isto impõe uma série de obstáculos para que este homem consiga realizar sua vontade.

      Para mim, uma das melhores partes - além, é claro, dos argumentos muito bem elaborados por ramón para tomar sua decisão - é quando ele está sozinho em seu quarto. Por que? Porque quando está sozinho com seus pensamentos, sentindo saudades de sua grande paixão: o mar; Ramón se imagina, contra todas as leis biomédicas e físicas, levantando da cama, correndo e tomando impulso para saltar a janela e voar, isso mesmo, voar! Voando, ele atravessa uma das paisagens mais lindas da Espanha e reencontra sua antiga amante, a praia. Com sua areia branca e macia e seu mar azul, cintilante e, ao mesmo tempo, furiosamente belo.


       Outro momento marcante é a visita de um padre paralítico que tenta convencê-lo a desistir da ideia da morte a partir de seus dogmas religiosos. Ramón simplesmente rebate cada argumento levado pelo assistente do padre, que não pode subir as escadas porque sua cadeira não passa pela curva da escada, sendo o argumento sobre a santidade da vida, sobre sua dignidade, seus familiares, o sentimento deles em relação a ele assim como de seus amigos. Ramón o expulsa de casa e podemos ver na expressão do clérigo um olhar ao mesmo tempo de consternação e de abalo, um sentimento de quem acaba de ter seus princípios perturbados e que está repensando o que aprendeu por toda uma vida.


      Ramón, com seus argumentos, consegue que milhares de pessoas passem a refletir sobre a questão da eutanásia. As opiniões ficam divididas em duas, representadas em grande parte no filme pelas duas mulheres que surgem em sua vida neste momento tão crítico: uma advogada que luta a todo custo para que Ramón consiga ter autonomia sobre sua vida e uma mulher mis simples que o ama a tal ponto que decide reavivar seu desejo pela vida e tenta persuadi-lo a não por um fim nesta. 

     Este filme nos faz refletir sobre o que é certo ou errado quando se diz respeito à autonomia do paciente, não apenas como receptor de serviços de saúde, mas como pessoa, ser humano. Faz refletir sobre o quão longe podemos levar o sofrimento com base em questões jurídicas, morais/ espirituais e psicológicas. E, por último, nos faz refletir sobre o poder da humanidade com relação à vida: por que será que a vida (mesmo aquelas em que não há mais nada além de sofrimento, frustrações e cansaços) nos parece tão valiosa que, quando aparece alguém que sente que a sua perdeu esta qualidade, a decisão de não querê-la mais é extremamente inaceitável? É um filme que traz paradoxos impactantes e que, justamente por isso, vale muito a pena ser visto.

Nathaly M.


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